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  • Foto do escritorGabriela Braun

Quarentena leva ao aumento do número de divórcios?


Nos meses de maio e junho o número de divórcios consensuais cresceu 18,7% segundo os cartórios de notas. Esse crescimento se deve ao fato de que, em 26 de maio desse ano, entrou em vigor o provimento que autoriza a dissolução de contratos de casamento à distancia, facilitando assim o processo de divórcio. Os estados do norte e nordeste foram os que registraram mais casos de separação. Mas essas estatísticas não se restringem apenas ao Brasil. A China vem mostrando também um numero crescente de casais que se separam desde o inicio da pandemia do covid-19.


Quando eu leio essas noticias, vejo essas estatísticas não consigo deixar de pensar que cada vez mais nos relacionamos de forma superficial com nossos cônjuges. Não revelamos completamente quem somos, não falamos das nossas vulnerabilidades de forma plena, ou seja, mostramos apenas aquilo que queremos que o outro veja. Isso sem falar na forma como nos comunicamos uns com os outros. Nossa comunicação costuma ser muito pouco clara e especifica e nos tornamos focados em gerar esperar que o outro faça as coisas do jeito que eu considero certo. Ou seja, se misturarmos tudo isso, temos uma receita perfeita para um relacionamento bastante conflituoso.


Quando trabalhei na concessão de financiamentos imobiliários de um banco costumava realizar entrevistas com os compradores do imóvel para analisar a capacidade de pagamento. Eu utilizava algumas técnicas de conversação para identificar se as pessoas estavam mentindo ou não. Sabe o que mais me chamava a atenção? O quanto esses casais sabiam pouco um do outro.


Com a chegada da pandemia e o isolamento social nos vimos desafiados a ficar sobre o mesmo teto 24 horas por dia. Muitos se viram obrigados a transformar o lar em escola, local de trabalho e espaço de lazer da família, tudo ao mesmo tempo. O tempo sozinho se tornou raro e a individualidade tem sido um dos itens mais atingidos durante o isolamento social. Ter um espaço na casa que seja só seu, onde você possa ficar uns minutos durante o dia ouvindo os próprios pensamentos é algo raro nas famílias do mundo todo.

Certo dia, prestando consultoria para uma mãe ela fez o seguinte desabafo: “o problema é que antes da pandemia, quando eu me irritava com meu marido eu pegava minha bolsa e saía de casa. Ia para o trabalho, para o shopping, dava uma volta e tinha tempo de me acalmar longe dele. Agora não tenho esse tempo longe, preciso me acalmar olhando para a cara dele e o conflito acaba sendo inevitável.” Não é que os conflitos não existissem antes da pandemia, o que acontecia é que, muitas vezes, eles eram deixados de lado. Há três anos trabalho com consultoria em educação não violenta e durante todo esse tempo, as demandas que mais recebo são como fazer para o filho fazer o que eu quero ou como fazer o marido ser mais participativo na educação dos filhos e gestão do lar. Isso mostra que esses conflitos sempre existiram e, de uma forma ou outra, escolhemos ir fazendo concessões ou fingindo que esta tudo bem para não precisar encarar fato de que conhecemos muito pouco um do outro, a nós mesmos.



A pandemia veio apenas nos mostrar que é preciso mudar a forma como nos relacionamos uns com os outros. Que nossa comunicação precisa estar voltada para atender as minhas necessidades, mas também as do outro. Quer ver um exemplo: Eu e meu marido dividimos as tarefas da casa e chegamos em um acordo de que ele fica responsável por cuidar da roupa e eu do almoço. Para meu marido, cuidar da roupa significa deixar o cesto de roupas sujas ficar cheio até a tampa. Só então ele leva para a lavadora de roupas. A roupa fica na lavadora de um dia para o outro e só então ele tira e coloca dentro do armário. Para mim, cuidar da roupa significa não deixar acumular roupas sujas no cesto, lavar e colocar pra secar tudo no mesmo dia, passar a roupa e então guardar. Mas eu não falei nada disso com meu marido na hora em que fizemos o acordo sobre quem iria fazer cada tarefa da casa. E nem ele me disse como gostaria que o almoço fosse feito. Depois de procurar uma roupa que gosto muito e encontra-la no cesto de lavar há quase 4 dias, fico furiosa e descarrego sobre ele toda minha frustração por ele não estar cuidando da roupa conforme combinamos. Mas eu estou cuidando, ele retruca. Pronto, conflito iniciado. E daí, pode surgir um sentimento de vingança e a famosa frase: Eu fiz isso porque você fez aquilo, passa a ser constante nos diálogos do casal.


Percebe como não somos específicos nos nossos acordos e pedidos e depois jogamos para o outro expectativas que não foram claramente discutidas? Isso acontece o tempo todo, só que em tempos normais, quando nos frustramos muito com o comportamento do outro, saímos, damos uma volta, conversamos com uma amiga ou amigo, fazemos um happy our e tudo fica mais leve. Em tempos de pandemia, nada disso é possível. É por isso que o número de divórcios esta crescendo. Enquanto culparmos o outro por ele ser quem é e não melhorarmos nossa forma de nos comunicarmos, viver sobre o mesmo teto será sempre um desafio.

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